Minha avó estende roupas num pequeno varal na janela, e o parapeito estreito, para mim é um extenso campo de batalha entre prendedores azuis, vermelhos, verdes... Prendedores de roupa parecem soldadinhos. Ás vezes algum morre e cai lá embaixo no quintal... – Você vai perder todos os meus prendedores! Diz vovó. – Olha lá, o trenzinho da Cantareira... Tentando me distrair com outra coisa, enquanto recolhe os soldados e acaba com a brincadeira.
Eu gostaria de saber o que quer dizer Cantareira, mas desisto de tentar perguntar. Já notei que adultos não gostam de dar explicações, muito menos quando se pergunta sobre o que não sabem. Estranhamente as pessoas mais velhas se conformam em não saber o significado das coisas. Eu não! Quero descobrir e o único jeito é prestar muita atenção, observar e tirar minhas conclusões.
Cantareira seria por que lá na serra mora uma mulher que canta? Então passa um trem no lugar onde vive uma misteriosa mulher cantora e as montanhas azuis parecem tão próximas, que se eu pudesse estender um pouco mais, meu braço alcançaria. Por alguns momentos vou até lá por meio da imaginação. Vejo o trem, a mata e uma casinha onde mora a Dona Cantareira.
Volto a lembrar dos soldados, gosto de montar fileiras e lamento que minha avó não tenha prendedores em número igual de cada cor. Ainda não sei contar muito bem, mas gostaria de ter fileiras iguais...
Fernanda (por Lúcia Soares)